Blog da Perestroika

segunda-feira, 26 de maio de 2008

O que acontece quando a gente cria apenas, somente e exclusivamente para televisão?

Por Fabiano Goldoni*


Antes de qualquer coisa, vou explicar o que eu faço para ganhar a vida já que não trabalho mais em propaganda. Para não encher o saco com muita explicação, eu posso resumir o meu dia-a-dia assim: Participo do processo de criação e produção de tudo o que aparece no canal FOX desde que não seja filme, série ou propaganda. Desde as chamadas dos filmes e séries, passando pelas vinhetas institucionais, até aquelas animações com a marca que não dizem nada muito diretamente, mas que dão identidade visual ao canal. Isso tudo é o que chamamos de Branding. Além disso, eu também tenho que garantir que o trabalho do departamento de marketing e relações públicas tenha unidade com as campanhas que criamos para cada produto da programação. É bastante coisa para fazer, mas acho que consegui resumir tudo em apenas um parágrafo.

Apesar de ser um meio de comunicação e ter bastante espaço comercial reservado para si próprio, um canal de televisão também precisa de uma agência de propaganda para anunciar em outros meios. Ou seja: de publicitário, eu virei cliente. Mas acontece que eu sou um cliente que também cria peças para vender seu próprio produto. Ou, como eu prefiro dizer, sou um cliente publicitário que trabalha numa espécie de House Agency, mas que faz um trabalho que nenhuma agência de propaganda é capaz de fazer: o trabalho de “propaganda” dentro do canal.

Os serviços de propaganda fora do canal são terceirizados. O resultado disso é que a agência acaba não fazendo o papel do ator principal na conceituação e planejamento da marca. Já que essa é a função do departamento onde eu trabalho, e que chamamos de On Air. A agência é um criativo coadjuvante nessa história, porém um coadjuvante de luxo, tipo o Morgan Freeman ou Paul Giamatti. Não por ego, mas porque o departamento de On Air tem um conhecimento profundo do consumidor. Estamos o tempo todo anunciando e medindo o resultado através dos medidores de audiência. Observamos o que funciona e o que não funciona com cada um dos públicos imagináveis de um canal de TV, durante as 24 horas do dia, todos os dias da semana. Por isso, como todo ator coadjuvante que se preza, o papel da agência é dar aquela sacudida, nos avisar para não embarcar no vôo 77, nos mostrar o caminho para Mordor e não nos levar para onde estão os Orcs. Em outras palavras, é dizer “Epa! Levar o King Kong pra Nova Iorque parece genial à primeira vista, mas no fundo vai ser uma grande cagada!”. Sempre em busca de soluções criativas: “Quem sabe a gente não filma o macaco gigante aqui na ilha e leva só o filme, hein?”. Enfim, ter aquelas idéias óbvias, porém geniais, que nós não tivemos durante todo o filme: “Vai por mim, criar um parque com Dinossauros é fria!” O que eu posso dizer é que a agência é fundamental para um final feliz.

Na prática, o que eu quis dizer com a minha exibição gratuita de metáforas cinematográficas, é que trabalhar numa agência para um canal de TV não significa que pessoas com um ego maior que o seu vão reprovar todas as suas idéias geniais porque essas mesmas pessoas têm um conceito pré-concebido da campanha. As idéias geniais apenas precisam estar dentro desse conceito pré-concebido, digo, dentro do conceito criativo da campanha de On Air.

Sim, é meio foda. Porque já é complicado criar campanhas para produtos de carne e osso. Imagine criar para uma série de TV que, antes de chegar nas suas mãos, foi baseada num conceito, ou se preferir, numa idéia. Logo, o desafio da agência é ter idéias para vender essa idéia.

Se for pensar, ter idéias para vender uma idéia não é um problema exclusivo das agências que trabalham para canais de TV a cabo. Aliás, todas as agências de propaganda que se prezam precisam ser especialistas em vender idéias. Acho que vocês já ouviram isso, mas nunca é demais recordar alguns exemplos:

A Nike produz tênis para correr, mas vende a idéia de que é possível ter uma vida saudável mesmo vivendo numa cidade repleta de concreto e poluição.

A Sony produz o Playstation, só que vende a idéia de que jogar video-game por 70 horas seguidas é tão divertido quanto brincar de fazer uma montanha humana.

A Dove faz sabonete, mas vende a idéia que as mulheres não precisam seguir um modelo de beleza para serem felizes.

A FOX, por exemplo, produz Os Simpsons, mas vende a idéia de que só uma religião tem tantos fãs (fiéis) pelo mundo. Como campanhas de On Air, de qualquer canal, não costumam ser tão famosas como as da Nike, Playstation e Dove, deixo aqui o link para que entendam. Se essa campanha, que chamamos apenas internamente de “Simpsonismo”, saísse da TV para a rua, a criação teria que partir do princípio de que é preciso criar uma campanha para promover uma religião e não a série Os Simpsons em si. Sacam a diferença?

Isso não significa que dentro do departamento de On Air não se pensa em propaganda. Quando nos reunimos para um brainstorm, as idéias não são separadas nas nossas cabeças por On Air e Off Air, ou por tipos de mídias. Afinal idéias surgem de forma aleatória e podemos criar na campanha para Internet ou guerrilha ao mesmo tempo em que pensamos nos conceitos, no design, nos trailers, vídeos e vinhetas.

O resultado disso é uma competição saudável entre o departamento de criação do cliente e da agência. Por um lado, pode ser ruim para a agência, porque não é uma competição muito justa, já que um dos lados tem o poder de decidir o resultado. Mas tem o lado positivo que é o de atender um cliente que tem um critério criativo mais apurado do que qualquer gerente de marketing.

Estar ligado à indústria do entretenimento e poder participar desse processo de interação criativa entre On Air e agência me fez ver a propaganda de uma forma diferente.

É sobre isso que eu vou falar nós próximos textos e, quem sabe, vídeos aqui no blog.

***

*Fabiano Goldoni é criador dos canais Fox e FX, em Buenos Aires e um cara do caralho. Se tudo der certo, em breve vai ser mais um Czar da Perestroika. O texto acima não foi tirado de lugar nenhum. É uma contribuição exclusiva do Fabiano para o Blog da Perestroika. A primeira de várias.

6 comentários:

Anônimo disse...

fala, goldoni! blz?

cara, tu tem blog? queria colocar nos nossos links de parceiros.

abração, velho.
tiago.

Fabiano Goldoni disse...

Fala, Tiago!
Tudo beleza?

Cara, eu desativei o meu blog pessoal.

Assinei um contrato de exclusividade com o Curso Perestroika.
Milhões!
Tô ganhando milhões!
Tô montado na grana!

Anônimo disse...

Pshhhh. Não espalha. O Marco Loco não tá ganhando.

Bruno Pommer disse...

Não seriam BILHÕES, como o márcio sempre fala?
(afudê o texto)

diego Haupenthal disse...

pessoal, pode soar estranho, não levem para outro lado, mas o tesão com que vcs escrevem sobre trabalho e/ou publicidade é excitante.
parabéns!

:)

i k e disse...

não te preocupa. ninguém vai levar pro outro lado. brincadeira, só pra discontrair.